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Mensagens Inesperadas - 28 e 29 - Eis o plano!






28
           
            O António esperava-me no bar. Como sempre, não usava a cadeira para se sentar, ouvia música sentado numa das mesas. Olhava o campo de jogos que a janela lhe recortava.
            -Olha-me aquele nabo, falhou o golo ­com a baliza aberta – gritou, abrindo repentinamente a janela. - A jogar assim, não tarda, estás no Benfica!
            - Ei, Tó, deixa lá o tipo. O Benfica ultimamente só tem ido buscar jogadores ao Porto!
            - Pedro! Desculpa, não estava a ver-te. Então, como correu a conversa na direção?
            - Bem. Contamos a história toda. Os meus pais tinham razão, não nos vai acontecer nada, nem a mim, nem ao João. O Xavier e o Eduardo continuarão a ser observados, e, sem provas, parece que nada mais poderá ser feito.
            - Se ninguém os apanhar com o produto, os tipos continuarão a fazer o que lhes apetecer aqui na escola.
            - Mas comigo não vai ser assim! O João ficou quieto mas eu não. Aquela brincadeira da Teresa não vai ficar sem resposta e o Xavier e o Eduardo não perdem pela demora. Não tenho medo deles! Vai ser na mesma moeda.
            - Não te vais armar em herói com aqueles tipos, pois não, Pedro. Por favor, pensa bem no que te vais meter.
            - Calma, Tó. Não lhes vou dar hipótese alguma. A força assusta mas a inteligência costuma ser mais forte.
            Naquele momento, eu organizava a minha nassa e era preciso atraí-los. Eu sabia que eles eram muito cuidadosos e desconfiados. Andavam sempre acompanhados e nunca deixavam a mochila em lado nenhum. De certeza que não era por causa dos livros. Um caderno de capa preta era o suficiente para guardar o pouco que captavam nas aulas. A Teresa também era de difícil acesso. Tinha pela frente a complexa tarefa de lhes dar uma lição e de os dissuadir de futuras vinganças.
            - O diretor também vai falar com os pais deles? - quis saber o António.
            - Foi o que disseram. Mas acho que eles não vêm à reunião. O Eduardo e o Xavier controlam o esquema todo lá em casa. Acho que até os pais têm medo deles. Uma desgraça.
            - Quer dizer, os tipos vão continuar a reinar e a meter na escola o que lhes apetecer. Mas os pais da Teresa são muito rigorosos, estão separados mas acompanham de perto o que filha vai fazendo. Se eles sabem, ela está metida em sarilhos, em sérios problemas.
            - Amanhã, temos a última aula de Educação Física do período. Àquela hora é só a nossa turma no Pavilhão, não é, Tó?
            - Acho que sim…
            - Amanhã, preciso da tua ajuda.
            Apresentei ao António o meu objetivo e a estratégia traçada para o alcançar. Já tinha provado ser corajoso e amigo no aniversário da Catarina. Agora voltava a precisar dele.

29

            A manhã de quinta-feira, penúltimo dia de aulas antes das férias do Natal, surgiu brilhante. O Sol contrariava a brisa gelada que durante a noite tinha passeado por cada canto dos edifícios escolares. A erva não resistia a uma fina camada de geada, curvando-se ao seu peso e temperatura. As árvores não escondiam as lágrimas que o gelo estagnara ao longo do tronco e dos ramos. Uma tristeza que esperava o abraço do sol. O verde escondido ainda teria de esperar. Por agora, a vida estava bem guardada à espera da melhor oportunidade que não tardaria.
            A Catarina devia estar quase a chegar. Tinha-lhe pedido para vir mais cedo para poder contar-lhe os planos que trazia bem guardados. Sentia um misto de audácia e medo. Mas não podia perder a oportunidade que aquele dia favorecia.
            - Mas eu não percebo como queres que faça isso! A Teresa não vai dar espaço!
            - As condições estão quase todas reunidas. Então é assim, durante a aula de Educação Física, enquanto a Teresa faz a autoavaliação, desces ao balneário e envias uma mensagem do telemóvel dela para o Xavier. A palavra-passe para o desbloqueares é t3r3sa. Mais tarde, envias outra do teu para o agente da Escola Segura. Envias os textos e apaga-los de seguida.
            - Achas que o professor vai autorizar? E a chave? Ele deixa sempre o balneário fechado!?
            - Hoje é o último dia de Educação Física e ele vai fazer a autoavaliação. Para não ser interrompido, a chave vai ficar à entrada do gabinete.
            - Percebi, quando ela for fazer autoavaliação, eu trato disso. Têm é de controlar o resto do pessoal.
            - Eu e o Tó tratamos do assunto. É só organizar um jogo de basquete. Nessa altura, afastas-te subtilmente e fazes o combinado. Vamos dar uma lição à Teresa e ao mesmo tempo pôr no sítio os amiguinhos dela. Depois da aula, vamos para casa e só amanhã saberemos o resultado.

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