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Pai, com quem vou ficar?




O menino tinha a pergunta suspensa nos olhos que naquele momento mantinha escondidos com as mãos. As palavras alinhadas no pensamento formavam uma onda que daria lugar a um silêncio assustador. Arriscaria? Tocou no ombro do pai que se encontrava no banco da frente. Parecia uma ilha. Olhava fixamente sem ver absolutamente nada.
- Com quem fico este fim de semana?
O silêncio confirmou-se.
De um lado, a insegurança, a incerteza que, como a sombra, pode impedir o crescimento. Do outro, a divisão, a bifurcação: onde antes era um, agora eram dois os caminhos. A dividi-los um fosso de segurança. O menino percorreria ora um, ora outro.
O silêncio continuava. Será que devia ter feito aquela pergunta?
Reparou pela janela do carro nas aves alinhadas num fio elétrico ali perto. Eram centenas, imóveis, à espera. Em breve partiriam rumo a zonas mais quentes, fugindo do longo inverno prestes a começar. Lá longe encontrariam as cores da segurança. Depois voltariam de novo ali para partilhar as aventuras de mais uma viagem. Era preciso deixar o lugar, soltar as amarras. A novidade da viagem é sempre mais do que a certeza de quem fica.
O pai do menino saiu do carro e voltou a entrar, sentando-se ao lado filho, sem libertar uma palavra que fosse.
- Já viste aquelas aves, pai?
- Não, não tinha reparado. Preparam-se para partir – acabou por afirmar.
- Já sabia. O que estarão a sentir?
- Não sei bem. Se eu estivesse no lugar delas, estaria a sentir medo e entusiasmo.
- Porquê?
- Medo, porque não saberia o que iria encontrar durante a viagem; entusiasmo, porque há sempre um prémio para quem arrisca e quer descobrir, para quem tem um sonho e procura realizá-lo!
- Achas que eu sou assim como aquelas aves?
O pai não controlou uma gotinha que rolou pelo rosto.
- Não quero sair deste fio, pai!
Um abraço uniu-os longamente.
O menino carregava assim o coração para a viagem. Ambos sabiam que o carinho precisa de carregamentos frequentes e que nos torna mais brilhantes.
- Vais ficar bem! Cada viagem que fazes é uma oportunidade. Não a desperdices. Daqui levas novidades boas. Quando voltares quero que me fales do Sol, do arco-íris, das árvores, dos rios – dizia ainda abraçado ao filho, fixando as aves que continuavam à espera.
Um carro tinha acabado de estacionar mesmo ao lado. O menino foi o primeiro a vê-lo. Estava na hora de partir, largar o fio. Beijou o rosto do pai que, de imediato, pegou no saco que fez questão de entregar à senhora que já esperava no exterior.
- Olá, mãe! – disse, enquanto lhe oferecia um beijo desejado. - Até segunda, pai!
E partiram.
- Mãe, viste as aves alinhadas?
- Sim. Preparam-se para partir para outras terras. – respondeu.
- Eu também estou sempre a chegar e a partir!
- Sim… espero que as tuas asas fiquem cada vez mais fortes!
 O menino compreenderia com o tempo estas palavras. Naquele momento, reparava já numa das aves que arriscara o voo inaugural e que todas as outras a seguiam.
Em breve voltariam.

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