O Sapo Toquinhas acordou com o Sol
a bater-lhe nas patinhas. Abriu apenas um dos olhos para ter a certeza de que
tudo estava bem à sua volta. Sorriu e procurou dormitar mais um pouco,
aconchegado entre as folhas. “Que bom!”
Naquele momento, as flores
dançavam ao sabor da brisa e ofereciam um perfume suave e puro que encantava as
abelhas que as observavam em voos inquietos, antes de pousar delicadamente. As
abelhas contavam segredos às flores. Disso sabia o Sapo Toquinhas. E eram segredos
mesmo secretos, daqueles que se escondem atrás dos olhos e das palavras. Assim
era, as flores escutavam pasmadas o sussurro das abelhas e nunca contavam nada
a ninguém. À noite, fechavam os ouvidos escondidos atrás das pétalas, mas, no
dia seguinte, ao primeiro sinal do Sol, mostravam as suas cores de braços
abertos. E as abelhas voltavam e trocavam segredos por um pouco de néctar.
A Teimosa passou junto ao nariz do
Toquinhas que insistia em manter os olhos fechados. Procurou uma solução para
acabar com aquela sonolência. Reparou então que, por cima da cabeça do amigo,
havia uma folha com várias gotas de orvalho. Não hesitou,
um, dois, três… saltinhos.
Um, doooooois, três. E as gotinhas
fizeram fila para rolarem em direção ao nariz do Toquinhas.
- Teimosa! – protestou, dando um
salto.
- Está na hora de vires comigo –
disse a Abelha Teimosa sem rodeios.
- Onde?! Não me lembro de ter
combinado alguma coisa – disse aborrecido. Mas reparou nesse instante que passavam
pelo canteiro as formigas comandadas pela Musculosa. E desta vez não levavam
nada nas mandíbulas. Marchavam e cantavam:
Um, dois, um, dois
Andar, descer e subir
Um, dois, um, dois
Em breve vamos ouvir
Um, dois, um, dois
Uma linda melodia
Um, dois, um, dois
Que alegra o nosso dia
Um, dois, um, dois
Oiçam bem com atenção
Um, dois, um, dois
As formigas aqui vão
Um, dois, um, dois
Nada nos pode vencer
Um, dois, um, dois
É forte a nossa união
Um, dois, um, dois
A Pipoca também espreitava todo
aquele movimento à sua volta. Dali também podia contribuir para que tudo desse
certo. O Velho Vagaroso esperava pacientemente para que todos se reunissem.
Dava orientações com os tentáculos e todos sabiam rapidamente o que fazer.
O Soneca estava também a chegar
com a Malagueta e o Frank. Procuraram um lugar ao Sol.
- Mas, afinal, para onde vamos? –
queixou-se o Sapo Toquinhas.
- Calma, em breve saberás.
Daí a pouco estavam todos juntos
no canteiro grande onde se afirmava um enorme pinheiro-manso.
A Teimosa esperava pelo sinal do
Velho vagaroso. Estava tudo preparado. Mal o pai do Mateus aparecesse junto das
escadas do alpendre tudo teria de ser muito rápido.
Aguardou.
Aguardou.
Ninguém se mexia.
Ninguém fazia barulho.
- Podem explicar-me o que se
passa? Estamos à espera de quê? – interrompeu o Toquinhas.
Não obteve resposta. Todos
mantinham os olhos postos na grande porta castanha.
Silêncio.
Silêncio.
Silêncio.
Repentinamente, a porta abriu-se. O
Pai do Mateus trazia o Penas, um canário amarelo que todos olharam com espanto.
- Nunca tinha visto o Penas! Que
bonito! Que cor! Que agilidade! – segredou o Toquinhas.
- Chiu! Caluda! – avisou o Soneca
a pedido do Vagaroso.
- Vocês já o ouviram cantar? Tem
uma voz encantadora, faz lembrar aquele músico que...
-Chiiiiiiiiiiiiiu!- ameçou o
Soneca que entretanto se aproximara dele com ar ameaçador. – Cala-te, não
destruas o nosso projeto.
Também o Mateus saía agora de casa
para ajudar o pai a limpar a gaiola do Penas. Retiraram-lhe a base para lavar e
deixaram a outra parte na tijoleira do alpendre. O Penas observava tudo à sua
volta e aproveitava para ouvir o canto dos pássaros. Lá dentro, não ouvia
aquelas melodias, aquela sinfonia de vozes que só a Natureza faz acontecer.
Juntou ao coro a sua voz que se espalhou, suave e aveludada, por entre as folhas
das árvores. Todos se calaram para o ouvir.
- Pai, o Soneca está a tentar
comer a Pipoca! Olha! – gritou o Mateus.
Correram os dois para o aquário.
- Pai, tens uma abelha junto à tua
orelha!
Que grande confusão! Enquanto
afastavam o Soneca e a Abelha Teimosa, os outros amigos seguiram as ordens do
Velho Vagaroso. Foi então que o Frank e a Malagueta se aproximaram da gaiola e
com as patinhas levantaram a porta que, por distração e pressa, não tinha sido
bem fechada.
- Pai, o Penas fugiu!
- Como!?
- Não sei, não está aqui, eu não
fiz nada! – respondeu o Mateus.
- Olha está ali, naquele ramo do
pinheiro-manso – apontou o pai.
O Penas sentia a brisa e o balanço
da árvore. Sentia-se perdido. Não sabia para onde ir. Nem sabia porque estava
ali. Não esperava aquela oportunidade. Começou a cantar. A melodia invadiu o
jardim. Magnífico! Que melodia! Que encanto!
- Mateus, ouves como canta?! Não
fiques triste. Ele vai encontrar um abrigo e forma de se alimentar.
O Velho Vagaroso fez sinal aos
pássaros que saíram das árvores ali à volta e vieram fazer companhia ao Penas. Cantaram
e saltaram de ramo em ramo. Depressa decidiram abandonar o pinheiro e voar para
longe.
A Natureza recuperava assim uma
das suas mais belas vozes.
Missão cumprida. O Velho Vagaroso
recolheu-se. Os outros voltaram para o seu espaço.
- Será que voltará ao jardim para
o ouvirmos cantar? – lamentou-se o Toquinhas.
- Temos de estar atentos –
respondeu a Teimosa, enquanto se dirigia com ele para o rododendro.
- Voltará para agradecer, tenho a
certeza – interveio a Musculosa que também regressava ao canteiro. - Entre nós
é sempre assim, um por todos e…
- Todos por um! – gritaram as
companheiras.
E todos seguiram certos da
harmonia que os unia.
Um, dois, um, dois
Andar, descer e subir
Um, dois, um, dois
A caminho do abrigo
Um, dois, um, dois
Vamos todas recordar
Um, dois, um, dois
A fuga do nosso amigo
Um, dois, um, dois
Oiçam bem com atenção
Um, dois, um, dois
As formigas aqui vão
Um, dois, um, dois
Nada nos pode vencer
Um, dois, um, dois
É forte a nossa união