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Toquinhas e os cinco gatinhos



O Mateus reparou que o computador estava finalmente livre e não perdeu tempo.
- Pai, posso ir para o computador, é a minha a vez!
- Podes, durante meia hora, depois preciso dele para continuar um trabalho.
A Clara e a Teresa estavam também na sala. Falavam com as bonecas que colocavam nos carrinhos e depois passeavam por caminhos que só elas conheciam. Iam com elas ao médico ou para a escola. O pai descansava no sofá e acompanhava aqueles movimentos com olhar curioso. Cada brinquedo espalhado pelo chão estava no sítio certo para as filhas, mas, para o pai, o melhor lugar para os ter era aquele saco de tecido colorido onde tudo cabia e ficava bem arrumado! Os adultos têm a mania que sabem sempre qual o melhor espaço para tudo, por isso insistem em arrumar os brinquedos em sacos, estantes e gavetas! Porém, curiosamente, é aí que as crianças os desejam, alinhados e prontos para uma nova aventura. Se deixados por ali ao acaso deixam de fazer sentido e ficam abandonados!
- Pai, já acabei, quando quiseres podes vir – disse o Mateus, interrompendo os pensamentos do pai.
- Acabaste o quê?! – quis saber o pai.
- Nada, depois tu vês – respondeu o Mateus, enquanto se dirigia para o jardim.
Daí a pouco, o pai percebeu as palavras do filho. O documento tinha ficado aberto. Leu-o com atenção.

Os 5 gatinhos.
Era uma vez uma gatinha chamada de Lucky resgatada da rua, deu à luz cinco gatinhos com a ajuda do Tomy, um gatinho que passava lá por casa para comer, mas era muito tímido, ao contrário da Lucky. Mas um dia três dos gatinhos desapareceram, incluindo o chamado Bola de Arroz, e então só sobraram dois chamados Malagueta e Frank, ambos com a característica do pai, eram muito tímidos. Mas, com o passar do tempo, a Malagueta foi ficando mais calma, mas o Frank mais tímido. Mas estão muito tristes por causa da Lucky. Porque ela faleceu e hoje em dia eu pergunto:
-Porque é que ela tinha de nos deixar?

Tal e qual. O pai ficou algum tempo pensativo. Uma pequena lágrima percorreu um dos olhos e preparava-se para deslizar pelo rosto. Respirou fundo, sorriu encantado com a sensibilidade daquela criança. “Porque é que ela tinha de nos deixar?” A pergunta era simplesmente admirável. A Lucky não deixara apenas cinco gatinhos, tinha também deixado aquele menino e toda a sua família. Encantador!
Lá fora o Velho Vagaroso espreitava pelo cano do regador vermelho.
- Que estás a fazer, Mateus? – perguntou a Inês, no momento em que passava para a lavandaria juntamente com a mãe.
- Nada, estou à procura da tartaruga.
- Já sabes que está escondida no fundo. Lá para maio volta à superfície – explicou a mãe.
- Eu sei, mas quero ver se mexe as patinhas – respondeu, enquanto lhe tocava com uma palhinha.
Ali perto, o Sapo Toquinhas seguia a conversa. Aproximou-se do Vagaroso e segredou:
- O Mateus está muito triste com o desaparecimento da Lucky!
O Velho Vagaroso concordou mexendo os tentáculos ligeiramente.
- Como é que isso aconteceu? – quis saber.
- O Soneca disse-me que foi ao atravessar a estrada…
- Pois, eu estava sempre a dizer-lhe para descansar e que a estrada era muito perigosa para o estado dela.
- Ela teimava. É que do outro lado da rua havia uma casa onde encontrava sempre bons alimentos… e ela tinha cinco filhos!
- Nesta casa há sempre sustento – protestou o Velho vagaroso.
- Mas foi uma heroína, um exemplo – continuou o Toquinhas.
- Porque dizes isso?
- Morreu para salvar o Frank. Ele segui-a e atravessou a estrada sem cuidado. Quando a Lucky percebeu que o filho corria perigo, correu para ele, querendo agarrá-lo pelo pescoço e afastá-lo da estrada perigosa… Ao ver a mãe, recuou, mas…
- E foi nesse momento que…
Ambos ficaram calados. Olhavam para Mateus e compreendiam o seu silêncio e tristeza. Era preciso dizer-lhe que os três irmãos estavam bem, acolhidos em casas próximas. Mas como?
- Mateus, sabes quem eu vi esta manhã, quando regressava a casa? – perguntou a mãe que saía da lavandaria com um estendal que colocava cuidadosamente ao Sol.
- Quem, mãe?
- O Bolo de Arroz e os irmãos!
- Estás a mentir!
- Nunca, filho! Acredita. Afinal estão vivos e cuidados!
- Que fixe!
O Mateus ficou radiante.
- Mãe, não se chama Bolo de Arroz, é Bola de Arroz!
E entrou entusiasmado em casa para dar a notícia.
O Toquinhas sorriu para o Vagaroso.
- Eu já sabia. O Soneca também já os tinha visto.
- O Rapaz precisava desta notícia – respirou aliviado o velho caracol.
- E tu também – gracejou o Toquinhas enquanto se afastava para o seu canteiro.
Em casa, todos ficaram radiantes.
- Podemos ir vê-los? – perguntou a Clara.
- Não, isso não é bom para os gatos. Temos de os deixar viver nas novas casas. Ficamos com o Malagueta e com o Frank. Pode ser?
- Fixe! – exclamou a Teresa.
- Mateus, podes chegar aqui? – pediu o pai.
O filho aproximou-se.
- Estive a ler a tua história. Linda, linda, linda! Estás de parabéns! Até apetece dar-lhe continuidade!
- Tenta, pai – desafiou, enquanto foi ver o porquinho-da-índia que tinha chegado havia poucos dias a casa.

O pai ficou a olhá-lo e fixou novamente o documento. Quem sabe? Pensou. E começou a escrever.

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