O portão abria
lentamente e a calçada, ladeada por arbustos e flores, ia surgindo. No início,
destacava-se um azevinho de folhas verdes e pontiagudas. As bagas vermelhas
pareciam groselhas ou mesmo mirtilos. O pai do Mateus gostava de lhe perguntar
se aqueles frutos eram comestíveis ao que ele já respondia com algum desagrado:
- Pai, já fizeste
essa pergunta mil vezes… claro que não, as bagas do azevinho são venenosas!... –
E aproveitou a oportunidade para testar o pai. - Esta semana, perguntei ao
professor que tipo de folha tem o azevinho, por acaso sabes a resposta?
- Boa pergunta. Eu sei que este
arbusto mantém as folhas durante todo o ano, por isso, tem folhagem
persistente. Mas aquela ginkgo biloba
lá ao fundo fica
despida no inverno. Que tipo de…
Não teve tempo de terminar a pergunta
que o Mateus facilmente antecipou para logo desviar a sua atenção para algo
que o preocupou repentinamente:
- Caducas, pai… Clara,
esquecemo-nos da tartaruga! Será que ela morreu?
Como a Clara não valorizou
a gravidade da situação, insistiu junto da mãe que tentou acalmá-lo:
- Não, Mateus, a tartaruga é muito
resistente. Além disso, tu pediste ao avô para a alimentar durante a nossa
ausência.
Mal o carro parou
debaixo do alpendre, o Mateus correu para o meio pipo. Era nesse recipiente que
a tartaruga vivia todo o ano. De outubro a abril, hibernava e, raramente,
aparecia à superfície da água. Nos restantes meses, gostava de esticar-se ao
sol em cima de dois cubos de granito e demorar-se nas refeições recheadas de
pequenos camarões.
- A Pipoca não está
aqui! Desapareceu! - Gritou o Mateus sem tirar os olhos daquela espécie de
aquário.
Naquele momento, o
Sapo Toquinhas deu um salto com o susto. Não esperava aquela algazarra e por
isso prestou atenção para perceber o que se passava. Acomodou-se entre as
gardénias e espreitou.
- Mas o aquário tem
uma rede, ela não conseguiria sair! - Espantou-se a Teresa que também se aproximou.
- Reparem! - O
Mateus apontava com convicção.- A rede está um bocadinho levantada. Com certeza
que a Pipoca saiu por aqui.
Neste instante, o
Toquinhas também ficou alarmado e pensou que a Pipoca era uma tonta. Aquela
aventura poderia trazer-lhe problemas muito sérios. De imediato tentou avisar
os seus amigos. Aproximou-se então do regador vermelho em cujo cano se
refugiava o seu amigo Vagaroso. O velho caracol demorou o tempo necessário para
aparecer no topo do cano. O Toquinhas esperou, naturalmente, para lhe dar a
notícia. O Vagaroso, depois de refletir sobre o acontecimento, acabou por
reagir:
- A Pipoca
deixou-se enganar por este dia de Sol. Ainda não é tempo de andar por aí à
procura de insetos. Os dias ainda são pequenos e pode não encontrar o caminho
de casa. Por isso, precisamos de ajuda especializada.
- Queres dizer
rapidez…
- Claro, o melhor é
procurares o Gato Sonecas ou a Abelha Teimosa. Um por terra, outro pelo ar. É
preciso que a encontrem e ajudem a regressar. Neste momento, deve estar perdida
e não encontra o caminho de volta.
- E por onde
começar, tens alguma pista?
- Vejo que ela
forçou a rede e saltou para as ervas altas e frescas do jardim. Mas não estará
por ali. Como está um lindo dia, deverão encontrá-la ao Sol, num canto da calçada,
ou em cima de uma pequena pedra.
Entretanto, o
Mateus, seguido pela Clara e pela Teresa, já percorria a calçada em busca da
Pipoca. Também se lembrara de que poderia encontra-la ao Sol e, portanto,
procurava-a nas pedras quentinhas. Nesse momento, a Inês resolveu mostrar a sua
opinião sobre o acontecimento:
- Deixem a Pipoca
em paz, se ela fugiu é porque está cheia de estar presa naquela água nojenta,
que horror! Sempre a comer aqueles camarões pequenos e malcheirosos. Eu fazia o
mesmo.
Mas ninguém ouviu o
que dizia. Caminhavam em silêncio, observando com cuidado todos os lugares.
- E se ela estiver
entre as ervas do canteiro do rododendro?! Vai ser muito difícil encontrá-la.
As ervas são altas e ela tem uma carapaça verde - lembrou a Clara.
- Sim, tens razão -
concordou o Mateus.
De repente, o
Mateus fez sinal com a mão para que as irmãs se calassem e pararam todos à
escuta. Ali perto, o Sonecas estava numa posição que o Mateus conhecia bem -
era a posição de ataque: focinho, patas anteriores e posteriores muito chegadas
ao chão, orelhas esticadas e atentas, olhar imóvel e o rabo a abanar
ligeiramente. Estava pronto a saltar como se fosse uma mola. Qual seria a
presa? Seria a Pipoca? O Mateus ficou preocupado. Tinha de fazer alguma coisa
para impedir o Soneca.
Nesse instante, a
Teimosa orientava o amigo que no meio das ervas procurava uma solução para
defender a Pipoca que corria muito perigo.
- Não te mexas! Ela
pode ver-te.
- Eu não tenho medo
da Revoltada! Ela pensa que por viver fora deste jardim é mais forte e sábia do
que eu, mas engana-se. Ainda tem de aprender a respeitar os animais. Acha que
pode comer tudo o que lhe aparece no caminho. Eu vou dar-lhe uma lição.
- A Pipoca não
consegue fugir, a Revoltada colocou-a de pernas para o ar e agora está à espera
que ela saia da carapaça…
- Malvada… Espera
que eu já te apanho. E saltou sobre a gata.
O Mateus correu
para o Soneca e gritou-lhe de tal maneira que até a Clara e a Teresa se
assustaram:
- Não faças isso!
Para, Soneca!
Só quando ultrapassou
a esquina do anexo é que o Mateus reparou que afinal o sonecas se lançara sobre
a Malvada para salvar a Pipoca.
- Desculpa, gatinho
lindo!
Enquanto lhe fazia
festinhas no pelo macio, a Clara pegou na Pipoca e começou a retirara-lhe o
lixo que se acumulara nas patas e na carapaça.
- Pronto, estás
salva. Vais voltar para o teu aquário. Já chega de aventura.
O Mateus viu que a
Teimosa rondava as orelhas do Sonecas e percebeu que tinham sido eles que
conseguiram salvar a tartaruga. Além de afastarem a Malvada, conduziram o
Mateus até ao sítio onde estava a Pipoca.
- Olha que tu és
uma tartaruga alpinista! Como é que conseguiste trepar a parede do aquário?
Riram os três com a
ideia da Pipoca Alpinista que agora descansava na sua pedra enquanto esperava
pela dose de camarões.
O Vagaroso recolheu
os tentáculos e voltou ao interior do tubo onde ia descansar durante a noite
que chegava de mansinho.
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