A meio do jardim havia um tronco seco mesmo em frente à
árvore mais alta, um liquidâmbar. Andava por ali o Sapo Toquinhas, aproveitando
a brisa fresca que se abraçava às folhas leves e coloridas que bailavam e
sussurravam alegremente.
Toquinhas não percebia o que fazia ali uma tira de tecido
branco agarrada ao tronco e ao liquidâmbar. Aproximou-se e viu que a Teresa
estava ao colo do pai e juntos baloiçavam serenamente naquela espécie de cama.
Deixou-se estar junto às folhas verdes que trepavam pelo tronco velho para
ouvir o que diziam.
- Queres ouvir uma história?
- Sim, pai, aquela do dragão enooooorme e terrível! –
respondeu Teresa abrindo muito os olhos e imitando umas garras com as mãos.
- Pode ser a princesa Teresa e o Dragão?
- Sim! – ouviu o Toquinhas que também ficou à escuta.
- Muito bem, vou começar – disse o pai, enquanto olhava o
jardim à procura de inspiração.
- Teresa era uma princesa linda e delicada como
a pétala de uma flor. Adorava caminhar por entre as árvores e respirar a brisa
fresca da primavera. Pela manhã, saía com as irmãs mais velhas para apanhar
flores nos jardins do castelo. Olhava longamente cada uma delas sempre
deslumbrada com as formas, com as cores e com o seu perfume. Juntas faziam
colares e coroas que colocavam umas às outras, enquanto sonhavam com cavaleiros
encantados, fortes e corajosos.
Um dia, enquanto brincavam junto às muralhas do castelo,
ouviram ruídos estranhos, cada vez mais próximos, cada vez mais assustadores. O
chão tremia a cada pancada,
POM, POM, POM...
Com
medo, correram para junto do poço atrás do qual se esconderam. Em silêncio.
Silêncio. Só Teresa teve coragem para espreitar. Mas, ao ver um ser tão
estranho, tão alto, tão feio, ficou tão amedrontada que se escondeu novamente.
Era um dragão enorme que tentava derrubar a muralha com a sua cauda robusta.
POM, POM, POM...
Então
as princesas encolheram-se ainda mais para que ele não as visse.
Depressa os sinos tocaram em sinal de alarme. O
castelo corria perigo!
DIIIING-DOOOONG, DING-DONG,
DING-DONG,
DIIIING-DOOOONG, DING-DONG,
DING-DONG.
Os cavaleiros
apareceram prontamente armados para a luta, decididos a defender as princesas
em perigo. Porém, mal viram o tamanho do dragão, perceberam que as suas espadas
nada poderiam fazer para o derrotar. O único que avançou de forma destemida foi
o cavaleiro Duarte.
- Quem és tu? - perguntou. O que pretendes deste castelo?
O dragão ficou ainda mais enfurecido, dando pancadas mais
fortes na muralha,
POM, POM, POM...
Contudo, o cavaleiro insistiu sem receio:
- É melhor procurares outro castelo, porque neste não te
deixamos entrar. Eu e os meus companheiros vamos derrotar-te, não temos medo de
ti. És um dragão sem chama.
O dragão ficou mais descontrolado do que nunca e abriu a boca
para lançar uma chama gigante acompanhada de um rugido que se ouviu por toda
aquela região,
BRUAAAAAAAAAA. BRUAAAAAAAAAA.
Todos estavam aterrados, todos tinham muito meeeeeeeeeedo!
Meeeeeeeeeedo!
- Por acaso tens alguma dor de dentes? Ou alguma dor de
barriga? Comeste algum cogumelo venenoso? Tens uma abelha na narina? Ou uma
unha encravada?
A cada pergunta que o cavaleiro Duarte fazia o dragão
respondia que não, ficando, inesperadamente, cada vez mais calmo. Por fim, deu
mesmo um suspiro de tristeza, escondendo-se atrás da muralha. Depois, para
surpresa de todos, começou a chorar.
Os cavaleiros correram para abraçar Duarte o bravo cavaleiro
que enfrentou o dragão assustador. Também as princesas deram as mãos à volta
dos cavaleiros, cantando e dançando muito felizes.
Todas menos Teresa que continuava de ouvido à escuta,
preocupada com o dragão chorão. Foi então que o cavaleiro Duarte reparou na
princesa.
- Teresa, o dragão foi derrotado. Por que razão estás tão
triste?
- Não ouves como chora? - perguntou Teresa. Não podemos
deixá-lo ali sozinho.
- O que pretendes fazer?
- Abrir o grande portão do castelo e trazê-lo para dentro das
muralhas.
- É muito arriscado, princesa, o dragão é muito perigoso.
- Já percebi o que se passa. Vai buscá-lo com os teus
companheiros. Eu fico aqui à espera com as minhas irmãs.
Ninguém sabia o que Teresa estava a preparar mas lá foram.
Daí pouco, voltaram com o dragão.
- Já sei como vamos resolver o problema do dragão - começou
por afirmar. - O que ele tem é fácil de resolver.
Cavaleiros e princesas esperavam desconfiados. Teresa
continuou:
- Basta apenas um pouco de água. Eu reparei que ele, quando
estava atrás da muralha, olhava sempre para o poço. Acho que ele tem muita
sede. Precisa de água para apagar as chamas que lhe fazem doer a barriga.
Duarte fez o que Teresa sugeriu e o Dragão bebeu, bebeu,
bebeu. E, quando se sentiu satisfeito, começou a tossir, a tossir, a tossir e
NADA, NADA, as chamas tinham desaparecido.
O dragão era agora mais um amigo feliz dentro do castelo.
Como forma de gratidão, Teresa ofereceu o seu colar a Duarte.
As irmãs fizeram o mesmo aos outros cavaleiros. E todos juntos dançaram à volta
do dragão que ao centro descansava. Vitória, vitória…
O Toquinhas estava com os olhos muito abertos de espanto e
reparou que a Teresa já não ouviu a parte final da história. Adormecera
embalada pela ternura das palavras, enquanto baloiçava no colo do pai. Mais
admirado ficou quando olhou à sua volta e viu que o Gato Soneca se tinha agarrado
aos fios da cama de rede e também balançava, a Tartaruga Pipoca também escutava
a história com o pescoço muito esticado, o Velho Vagaroso chegava finalmente ao
topo do regador para ver o que se passava no jardim, a Formiga Musculosa dava
ordens para recomeçar a marcha para o formigueiro e que a Abelha Teimosa
decidiu mudar de flor.
De repente, ouviu um ruído assustador
POM, POM, POM...
e saltou rapidamente até se esconder debaixo do seu
rododendro.
POM, POM, POM...
- Um momento, por favor – disse a Inês, enquanto se dirigia
para o portão.
Nesse momento o Sapo Toquinhas ficou descansado, afinal não
era nenhum dragão desdentado e sem chama.
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