- Pai, o que
vês para além deste dia?
- Vejo o que
fiz e prevejo o que não fiz.
- Hum, só isso?
- Sim, tenho
memórias e projetos. O que faço hoje, ocupando o tempo que vai deixando de ser
futuro, torna-se passado, vestígio longo e permanente.
- Então vês
apenas aquilo que os teus olhos alcançam?
- Não, filho.
Através dos teus, alcanço outro horizonte para lá do meu.
- Certo. E o
que vês quando me abraças?
- Nada, gosto
de fechar os olhos quando abraço.
- É melhor o
abraço?
- Sim, por
momentos, recusamos o tempo e, quando abrimos os olhos, regressamos mais fortes
para o enfrentar.
- Dás-me um
abraço?
- Claro.
A cadeira
baloiçava levemente.
O silêncio
acariciava a brisa que tocava levemente as folhas das japoneiras.
- Pai, o almoço está pronto.
Surpreendido, olhou
o filho, levantou-se e seguiu-o. Ainda pensou em falar-lhe sobre aquelas
coisas, mas o melhor era começar pelo abraço.
Fixou o melhor
momento: ao deitar, quando a noite nos segreda as memórias que discretamente mistura
com os sonhos.