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Ganhas quando perdes?

A Clara entrou no carro, atrás do Mateus, sem dizer uma palavra. Não era habitual.
- Clara, correu tudo bem? – perguntou a mãe.
Ela não respondeu.
O pai arrancou, fixando, por momentos, os olhos da mãe, em busca de uma resposta.
Era sexta-feira, pouco tempo faltava para as três horas. As nuvens acumulavam-se num só espaço, cada vez mais cinzentas, cada vez mais escuras e o vento aguardava, mirando pasmado aquela construção.
- Quando é que volta o sol? – lamentou-se a Clara.
- Também já sinto falta – concordou a mãe.
O trajeto era curto. Depressa chegaram a casa. A Clara reparou então que as árvores do jardim continuavam encolhidas, voltadas para dentro. Parecia que também elas esperavam pelo sol.

- Mãe, porque é que as árvores se despem no inverno?
- Sem as folhas, talvez possam aproveitar melhor o sol que lhes aquece o tronco e os ramos… Mas ainda não me disseste por que razão estavas tão pensativa.
- Ouvi uma notícia no rádio do carro esta manhã.
- Que notícia?
- A do polícia que morreu quando tentava prender um ladrão que assaltava um banco.
- Esse homem foi um herói: entregou-se para que o assaltante libertasse os reféns! – interveio o pai.
- Não percebo.
- Foi um vencedor – reforçou a mãe.
O Mateus ouvia a conversa e não entendia o que os pais acabavam de assegurar – para o petiz, um herói teria de ser extraordinário, invencível.
- Também não percebo – interveio.
- Este homem deixou bem claro que, para ele, foi mais importante salvar as pessoas do que proteger-se. Desafiou-nos com uma lei que não conhece fronteiras.
- Não sei bem o que é uma lei – disse o Mateus.
- É uma regra, uma orientação – explicou o pai.
- Tal como uma bússola?
- Parece-me bem – concordou a mãe. - Como uma bússola. Quando encontramos vários caminhos pela frente, temos de decidir por qual continuar. Assim, quando temos de fazer uma escolha, também podemos ter uma regra que nos ajude a decidir.
- A regra do sorriso? – arriscou a Clara.
- A lei do abraço? – tentou o Mateus.
- É mais do que um abraço e mais do que um sorriso – respondeu o pai.
- Houve em tempos um extraordinário pensador que entendeu a lei de uma forma muito especial. Dizia ele: “Ama e faz o que quiseres” - acrescentou a mãe.

- Mãe, já está Sol! – espantou-se, repentinamente, a Clara.
Naquele momento, as nuvens abriam caminho para que o sol passasse, sorridente, brilhante. Vestiam-se de branco e tinham escolhido a melhor forma para o receber.
- Mãe, diz-me, então, qual é a lei? – quis saber a Clara.
- Ajudas-me a levar estes sacos para dentro? – arriscou a mãe.
- Oh!, mãe, mas eu quero andar de baloiço!- protestou.
- Ajudas?
- Está bem, mas depois volto para andar de baloiço!
A Clara começava a entender.
Também as azáleas e as camélias mostravam orgulhosamente as suas cores vivas e alegres, incentivando toda a natureza a procurar o sol, a brotar, a irromper do interior onde, durante meses, vivera fechada, à espera.

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