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Hoje é dia 24!

 



Estava sentada no sofá, confortável e serena. Finalmente, os horários dependurados no frigorífico tinham acalmado, abrindo uma certa clareira que tornava o tempo mais confortável e macio.  

A manhã estava fria, recuperava da noite que deixara nos carros parados nas bermas um manto gelado. Também as ervinhas se curvavam sob a geada que as cobria com uma brancura que aguardava os primeiros raios de Sol para se desfazer em pequenas gotas que desciam depois à terra que ansiava pela primavera ainda distante. 

- Bom dia, filha! 

Voltou os olhos brilhantes para o pai, juntou as mãos como quem segura uma expectativa que não quer deixar escapar: 

- Hoje é dia 24! Hoje é dia 24! 

Sim, dia 24. E ficou a pensar na esperança que saltava nos olhos daquela criança. 

- Os primos mais logo também vêm? 

- Claro, os primos, os tios, os avós, estaremos todos! 

A esperança começa sempre no presente. É no presente que germina e ousa brotar, romper a fronteira do tempo, ser o que há de ser, um advento. É no presente que lança as raízes de onde emerge o sonho, esse periscópio que nos traz o longe. Acrescentou: 

- Todos juntos! 

- E o Pai Natal vai bater à porta como no ano passado? 

- Vai... bate à porta, deixa as prendas e parte de imediato, porque tem muitas casas para visitar. Mas não te esqueças de que no Natal fazemos festa para celebrar o nascimento de Jesus! 

Era bom que esta raiz também alcançasse profundidade. O Menino que nasce desconcerta-nos, convida-nos a não sermos a medida de nós próprios. A não enchermos o peito de certezas que mais não fazem senão disfarçar a nossa fragilidade. A não sermos senhores de todas as decisões como se fôssemos únicos detentores de nós próprios. 

- Eu sei, pai – respondeu, procurando o presépio que perto perpetuava a simplicidade da cena que acolheu o Menino. 

E ali estava a proposta de vida, radical: fiat! Quem se atreve? Faça-se, no olhar carinhoso, no silêncio atento e disponível, na espera confiante, nos braços fortes e acolhedores. Faça-se na visita despojada e sincera. No presépio a medida que sempre nos escapa e desafia.

Olhou novamente a menina que voltara aos desenhos animados e desejou que também crescesse em sabedoria e em graça. 

- Teresa, já queres tomar o pequeno-almoço? 

- Quando os manos descerem, assim tomamos todos juntos.  

Começava a chegar o dia 25. Ainda bem. 

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