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Pelo saber também vamos

 

- Já acabei o trabalho!

- Qual?

- A entrevista sobre o 25 de Abril – explicou a menina.

- O que lembramos nesse dia? - interessou-se a mãe.

Nesse momento, o irmão, um pouco mais velho, resolveu intervir, tentando mostrar uma certa maturidade que logo se mostrou frágil nas primeiras palavras:

- A Implantação da República, mãe! Já sabias que ela andava a fazer um trabalho sobre isso…

O silêncio que se seguiu foi como aquele intenso momento em que se atinge o ponto mais alto da montanha-russa, tempo de agitado sossego que repentinamente dá lugar à descontrolada descida:

- Pensa bem no que estás a dizer! Não esperava que confundisses de forma tão leviana dois acontecimentos fundamentais da nossa história – advertiu-o a mãe, tentando suster a revolta interior que, não transbordando nas palavras, rebentou na dureza do olhar.

- Tem calma, mãe… confundi, pronto.

- Pronto!? Esperavas que aceitássemos de forma pacífica um erro tão grosseiro? – juntou-se o pai.

O rapaz fixou os limites da pedra onde colocava os pés e encolheu os ombros, enquanto os pais procuravam ainda libertar-se da tontura provocada por aquela descida abrupta. Já tinham falado várias vezes sobre um certo alheamento que consideravam preocupante. Pareciam viver em cima de um telhado! Assim descreviam os aprendizes sempre tão ligados, mas tão desligados. Era preciso levantar os olhos para ver e ouvir melhor.

- Qual é o problema? Basta fazer uma pesquisa rápida… Vês?! Está aqui – atreveu-se o rapaz, mostrando no ecrã a informação daí resultante.

Ainda não sabia que a informação não podia estar apenas ali! Que, qual alimento que percorre os caminhos que a raiz lhe proporciona, deveria transformar-se para depois abrir-se em saber, em consciência, em flor e em fruto.

Que estava sempre disponível e era de fácil acesso!

Não! Não podia deixar a pena, nem a espada, nem a lança! Se em tempos se lamentava o poeta da rudeza dos que levantavam a espada, hoje mais se lamentaria, porque não levantam a espada nem a lança e a pena não a estimam. Nem Gamas, nem Augustos.

- Instalei uma aplicação capaz de fazer um trabalho organizado e completo sobre os mais diversos assuntos… - insistiu ainda o rapaz.

A mãe tinha a resposta pronta, mas rapidamente a reteve por lhe parecer facilmente rebatível. Sabia que sempre houve forma de plagiar, de adulterar os trabalhos. O pai percebeu a sua hesitação:

- A disponibilidade da informação será sempre uma mais-valia! Importa é o que fazemos com ela. Se a tecnologia consegue superar-nos na procura, na seleção e até na articulação, criando, surpreendentemente, um texto coeso e coerente, então só temos é de inovar a partir desse patamar. Usar de forma crítica essa conquista. E, mais do que nunca, fazer a viagem, ler a narrativa, ouvir o poema… A beleza não se quer aprisionada nas palavras já ditas, mas reinventada em cada encontro sempre debutante. Aí se revigora a humanidade.

O rapaz retirou-se. Ia pensativo. Ainda ouviu a mãe perguntar à irmã mais nova por que motivo não tinha aulas no dia 25.

- Eu sei! – gritou de imediato. – É o dia-da-liberdade!

E levantava os braços como quem eleva uma bandeira que guia quem a segue.

Uma bandeira que o saber mantém erguida. O saber que desmascara o machado que corta e se afeiçoa quer ao destro quer ao sinistro.


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