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A formiga quase retida



          A Musculosa orientava as buscas naquela manhã brilhante e fresca. Seguia as indicações partilhadas pelas batedoras e avançava com determinação.


Um  dois um dois

Nós marchamos todas juntas

Um  dois um dois

À procura de sustento

Um  dois um dois

Ninguém fica para trás

Um  dois um dois

Ninguém fica sem alento

Um  dois um dois

 

- Alto!

A ordem da Musculosa percorreu o pelotão que prontamente obedeceu.

 

Um  dois um dois

O perfume que me encanta

Um  dois um dois

Vem por certo desta flor

Um  dois um dois

Vou subir por este caule

Um  dois

 

- Alto! – gritou novamente a Musculosa, não conseguindo parar a formiga aprendiz que naquele momento já se desviara do carreiro. O pelotão atónito seguiu-a com o olhar.

 

                     Um  dois

Ai que folha tão macia

Um  dois um dois

Ai que cor tão refrescante

Um  dois um dois

- Formiga aprendiz, desce imediatamente! Temos de marchar todas juntas. Aí não encontras alimento.

 

Um  dois um dois

Finalmente cá no alto

Um  dois um dois

O perfume aveludado

Um  dois um dois

É no chão que caminhamos

Um  dois um dois

Mas no alto é que alcançamos

Um  dois um dois

 

A Musculosa estava já no limite da paciência.

- Formiga aprendiz, volta para o teu lugar. Se não desceres, ficas aí até ao nosso regresso, retida e só. Se não aprenderes a marchar, ficarás retida no formigueiro e nunca serás a obreira que sempre sonhaste.

A formiga aprendiz sentia o calor do Sol, enquanto percorria as pétalas inebriantes. Do lugar onde estava o horizonte era inefável!

A Musculosa não esperou mais. Deu ordem de marcha, não resistindo a comentar com as aprendizes mais próximas:

- O que prenderá aquela formiga no mais alto daquela flor?

Nenhuma lhe respondeu. Todas queriam marchar. Todas queriam encontrar a sua migalha.

Mas a Musculosa não se sentia segura. A companheira retida nas pétalas de uma flor não podia ficar para trás.

- Alto! – ordenou novamente, voltando ao compasso marcial.

Um  dois um dois

Nós marchamos todas juntas

Um  dois um dois

À procura de sustento

Um  dois um dois

Ninguém fica para trás

Um  dois um dois

Ninguém fica sem alento

Um  dois um dois

 

As aprendizes ficaram ainda mais desorientadas, quando perceberam que a Musculosa se dirigia a um dos caules mais próximos, ordenando que todas fizessem o mesmo.

 

Um  dois um dois

O mais alto destas flores

Um  dois um dois

Todas vamos conquistar

Um  dois um dois

Alterar a nossa marcha

Um  dois um dois

Também nos faz avançar

Um  dois um dois

 

Ao sinal da Musculosa, todas iniciaram a subida. Deixaram o chão, o carreiro que sempre percorreram, agarradas às rugas de cada pedra, ao vocabulário necessário em cada rota, certificadas pelo esforço dedicado a cada caminho sempre horizontal, confiantes no horizonte apertado e sempre perto.

Subiram.

Subiram ainda mais.

Dançaram ao ritmo da brisa fresca.

Inspiraram o perfume segredado em cada pétala.

Tocaram as cores e as formas que ao longe lhes pareciam pouco nítidas.

Naquela altura, o sonho tinha mais espaço, mais distância, mais esperança.

- Daqui vemos mais longe! – entusiasmou-se a Musculosa.

- Reparem – apontou uma das aprendizes.

Eram apetitosas maçãs que dali facilmente se avistavam.

 - Daqui vemos mais longe! - gritaram todas.


Um  dois um dois

Nós marchamos todas juntas

Um  dois um dois

À procura de sustento

Um  dois um dois

Ninguém fica para trás

Um  dois um dois

            Ninguém fica sem alento 

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